—Eu já vou, Carol! Eu já vou!! Bradava a mulher ao telefone. O vento soprava leve. Até mim chegava um cheiro de cinzas, proveniente da mulher que bradava ao telefone. Seus lábios estavam bastante escuros, os óculos transparentes não escondiam sua expressão desesperada. Sua mão direita estava suspensa até a altura do ouvido, seus dedos tentavam diminuir os ruídos dos carros que passavam perturbando o ambiente. Carol não sabia como seu irmão havia sumido. Ela exigia pressa de sua mãe, afinal, sabia lá no fundo que o mundo é desilusão e violência.
— Alô, quem está falando?
— Eu quero falar com meu filho!
Uma voz do outro lado da linha desdenhava de Raquel.
— Esse celular é do meu filho, é sim, e eu quero falar com ele agora! Que brincadeira é essa?!
Passa algum tempo, Raquel sente algo incomodando dentro de si, cenas ruins lhe ocupam a mente. Nessa vida, pensa ela, só se espera o pior. Sua mão quase não era mais capaz de eliminar as ondas de suor que surgiam cada vez mais rápidas em sua testa. De repente, uma mulher se aproximara e perguntara a Raquel se ela está se sentindo bem. Entre a ligação e a estranha mulher que se aproximara, Raquel fez que não com a cabeça, sem saber exatamente a quem está respondendo. O não com a cabeça era a tentativa de eliminar as cenas ruins que invadiam sua mente. A voz do outro lado cessou. Raquel angustiada gritava: Alô! Alô! Alô! Seu rosto se transforma em uma careta terrível.
Tenta ligar novamente e, para isso, pressiona os números do celular com toda força possível. Nada. O número para o qual você ligou está fora de área ou desligado. Raquel então como se falasse sozinha começou a explicar a estranha mulher o que nem mesmo ela entendia. A mulher pousa a mão no ombro de Raquel pedindo que clamasse por Jesus. Raquel desaba em choro. A cabeça baixa e o soluço alto. Seu celular ascendera novamente, e uma vibração alerta uma ligação que chega. Era Carol, novamente, queria notícias do irmão.
—Nada, Carol! Tem alguém com o celular dele, eu to chegando! Raquel desligou o celular, mas continuou com a cabeça baixa. A estranha mulher continuou com a mão sobre o ombro direito de Raquel, fechou os olhos com força e começou a balbuciar palavras estranhas, somente o nome de Jesus era possível ser escutado, ou então era alguma palavra bem parecida. Raquel controla seu tremor e, em silêncio, se desvencilha da mulher estranha. No ponto de ônibus, onde estavam Raquel e a mulher estranha, aproximou-se um ônibus. Havia muita gente lá dentro. O letreiro eletrônico do ônibus disputava com o Sol, e, por isso, era difícil ler o destino daquele grande carro que espremia pessoas com destinos tão diferentes. Acotovelando-se entre as pessoas que resistiam antes da catraca, Raquel some no horizonte enlatado.
Hoje, ás dezenove horas, deu no jornal que um jovem de dezessete anos foi assassinado próximo ao local onde morava, após ter o celular furtado. Com certeza, não era o filho de Raquel mais uma vítima da violência urbana, era coincidência demais.