Voltei pra casa. Era sábado. Bati palmas. Dei três pancadas no portão. E avancei a história.
– Sandro! Tu não me ouve mais? Gritei.
– O sol tá quente, Sandro! Expressei agonia.
– A feira tava cheia! E tu me deixa esperar assim?! Acusei.
– De novo, Sandro!? O que tu quer?! Quebrar a porta do quarto?! Sentenciei.
– Avia, rapazinho, traz a feira pra cá. Interajo com o único.
– Toma teu dinheiro, vai embora! Pago o espectador.
Fecho o portão. E volto à história.
– Sandro, disse bem perto pra ele não ter saudade do desenho feio do nome, carne fresca ou salgada?
– Ensopado de legumes com carne com osso pra gente sentir aquele cheirinho do repolho impregnado de carne, hum? Falei com a boca cheia d’água.
– Oh Sandro, tu tá tão bonito assim. Admirei.
– Tu nunca foi tão bonito. Elogiei.
– Por mim nem te lavava, fazia assim. Imaginei o trabalho.
– O vermelho deu mais vida a tua pele. Minha observação de arte.
– Filho! Me ajuda, vamos, pra bacia. Clamei.
– Oh meu filho, como tua perna é bonita! Sou toda admiração.
– Olha que bonita! Mostro.
– É bonita, mas vai dá um trabalho. Me lastimo.
Fiz tudo sozinha, Sandro nunca me ajudou. Limpei, esfolei, separei as partes, reservei os legumes, apreciei a cabeça de repolho crua, antecipando o cheiro e o sabor de sua textura enrugadinha e fina.
Dia de feira é o melhor dia pra produzir carne fresca com osso. Acordar cedo. Certificar-se do descanso do animal. Ir pra feira, andar na feira, cumprimentar os conhecidos, todo mundo tem que ver, reclamar do menino, todo mundo tem que ouvir, escolher os legumes mais brilhosos. Comprar devagar, escolher bem, demorar na barraca de melancia, reclamar que queria uma inteira, mas sozinha, nunca pode carregar. Chamar um rapazinho diferente do de costume pra carregar suas compras até em casa. Chamar na porta de sua própria casa, monologar no interior.
Despachar a principal testemunha.
Servir no almoço de domingo ensopado de legumes com carne com osso curtida do sábado. Deixar que sua mãe, a indigesta imagem do almoço de todo domingo, chupe os ossos na mesa. Lamentar mais uma vez do filho. Apreciar o repolho no prato, alimentar-se daquele fio de carne que se adere a pele enrugada amarelo-xixi do repolho cozido com carne de osso curtida do sábado, se despedir dos indesejos da mãe.
Respirar aliviada.
Acomodar-se sozinha no sofá. Abraçar uma a uma as páginas soltas de papel reciclado da nova edição limitada do livro de poesias do Quintana e sentir-se satisfeita.