Conheci Sandra no posto de saúde. Conversa vai conversa vem, nos tornamos amigas, simpatizei com ela desde o primeiro momento. Uma morena bonita, tipo índia, cabelos compridos, lisos e brilhantes, como fios de nylon, falava manso e devagar. Começou me contando de quando chegou na cidade até aquele dia: morava na roça antes, vivia de plantar e colher, casou-se com um rapaz que trabalhava na fábrica de papel, por isso veio morar aqui com o marido. Esse que, depois de algum tempo, começou a revelar seu mau caráter, deixava-a com fome, chegava bêbado e batia.
Falou-me que o pior de tudo eram as traições, cada dia com uma diferente.
Há poucos dias, ele a havia traído com a vizinha casada. Ela acompanhou tudo até ele entrar na casa, depois de o marido dela ter saído. Aconteceu várias vezes, me disse ela. A estratégia dele era deixar ela dormir e, então, saía pela janela e voltava. Um dia, depois de planejar tudo, Sandra deixou ele sair e fechou a janela por dentro, ligou para o tal traído marido e disse que a casa estava pegando fogo. Ele veio imediatamente. Não vendo fogo algum, bateu na porta, ia chamar a esposa quando o traidor se assustou e saiu correndo sem roupas. Correu em busca da janela fechada, desesperado a bater mas sem êxito, até que foi alcançado pelo furioso traído, que o rebentou no pau, mas bateu tanto e só parou quando Sandra abriu a porta fazendo-se de inocente, correu a socorrê-lo e lhe jogou no banheiro pra lavar a sangraria, pra saber onde estava ferido. Concluiu a conversa com a voz mansa e pausada, a expressão de vingança:
— Estou aqui para pegar os remédios dele, está tendo febre todos os dias e os pontos da cabeça estão inflamados.
A atendente chamou e ela se foi em passos lentos, tanto quanto sua voz.