Certa vez, lá em meu sertão, estive com um senhor cheio de ideias e, para aproveitar aquela experiência e astúcia, pedi-lhe um conselho geral. Ele se contrariou:
“Não vamos tornar a conversa besta. O perguntante de uma coisa assim bem sabe que não é honesto. Quando se pergunta sobre o que fazer da vida, só se mostram as opções de fácil entendimento pro outro avaliar. Ficam uma quarta e uma quinta escondida pela vergonha de falar de um sonho mesmo ou de um medo, quando na maioria das vezes são as legítimas. Se você entrega uma pergunta pela metade, de onde eu vou tirar uma resposta inteira? Só se for do meu mesmo mundo inteiro, que no seu pode não ter valor nenhum, pois tudo aquilo que eu fiz em minha viagem foi pra dar conta do que me apareceu e que não se repete.
Se o perguntante fosse me pedir conselho para plantar batata ou cebola esse ano, aí eu dava, porque é uma coisa ou outra, e dentro de uma coisa que não é nem minha nem sua. Mas mundo de cada um é delicado por demais. E é preciso ter atenção nisso, porque hoje só se vê gente que dê pitaco. Tem quem lhe veja trabalhando e já chega: ‘Por que não faz aquilo? Olha as oportunidades! Por que não pensa naquilo outro? Não se acomode’. Vai amolar faca!
Aí fica um besta pensando que só porque alguém está cortando cana do mesmo jeito que ele, ao lado dele, com a foice parecida, com o chapéu igual, é pelo mesmo motivo! O motivo de cada um é como a foto da mãezinha que a gente guarda e que mostra pouco pra não desbotar. Explicar-se é muito extenso e não é pra qualquer outro.
E se a gente se descuida no escutar, fica em casa com o juízo imprestável por uns dias, encucado: ‘Mas é né? Por que é que eu não faço aquilo mesmo? Se o outro vai fazer, por que eu não faço?’ Hoje eu nem pego amizade com um cabra assim: sei que quem gosta de aconselhar muito só pode achar que olha pra um espelho. Pois fique lá se admirando! E se não consegue tomar uma rédea sem ter um grupo de gente fazendo o mesmo, o problema é meu ou da Virgem Maria? É isso que eu digo, moço, conselho mesmo é saber se você deve voltar agora ou não com o cavalo por causa da chuva. E se o senhor quer saber, é milhor!”
Segui.