Saudade não conhece manchete ruim de jornal. Esquece o salitre que come os eletrônicos por dentro, ignora a página policial do fim de semana, passa feito rolo compressor na reforma do Rio Vermelho. Saudade só pensa em bem, no que aquece o coração: no mar bonito de Itaparica, nos sorrisos e abraços que esperam, no cheiro de alfazema do barracão em dia de festa pra Iemanjá. É nisso que a saudade gruda. Sua única matéria é o que foi bom.
Saudade pede passagem de avião, música de Gilberto Gil na solidão de uma tarde longe e contagem regressiva: faltam duas semanas pra passar de novo pelo bambuzal do aeroporto, pra comer o peixe escabeche da vó, pra ver o mar no caminho de casa outra vez. Pra acordar com os pais, abraçar os amigos, pra dar bom dia a Roberto, o açougueiro, pra encontrar Socorro no elevador. Saudade pede também paciência de uma variedade quase impossível ao coração.
De que outras coisas então a saudade seria feita? Difícil de traduzir e mais ainda de explicar, saudade só se entende mesmo é do lado de dentro. E então as milhas, a distância, tudo multiplicado por mil, mas sonhado pequenininho, quase ínfimo. Avisa por aí que já chego pra matar as saudades. Que ainda falo oxente, que ainda ando descalça por tudo quanto é canto, que não peguei medo de sereno. Marca logo a massagem no Jardim de Alah, pertinho do mar. Lasanha de camarão no Sal Marinho. Prepara os beijos e abraços que tô indo aconchegar o coração, pra voltar com ele todo bronzeadinho. Tudo que é perto pra mim ainda é muito longe de Salvador. Porque saudade não conhece manchete ruim de jornal.