à minha mãe, Anatália
minha mãe morreu hoje
não rezei, não abracei fotografias, não xinguei deus
ficou tudo como estava:
a máquina de lavar, a rua, o tempo, a casa
minha mãe morreu hoje
há nove anos seu corpo horizontal e imóvel
me enterra num velado silêncio de velório
minha mãe morreu hoje
desde então vivo sem perdão
– sem o colo em que me encolho
para, criança, em vão, acreditar de novo –
minha mãe morreu hoje
todo esse tempo, sem por que nem pecado
sem deus ou diabo, sigo só:
homem sem fé, mas culpado.
Publicado em: Enegrescência, Ogums Toques, 2016.