Sabe, moça da encruzilhada,
quando te encontrei foi um assombro.
Tu trazias estampada no semblante
a indagação que me acompanha.
O mais espantoso é que também
eras a resposta que sempre busquei.
Não aquela resposta exata, matemática.
A verdade que tua chegada me trouxe
foi a das abelhas zunindo no romper da aurora
em busca do mel das flores das algarobeiras,
foi a dos cavalos galopando na boca da noite
sonhando com touceiras de capim e éguas luzidias.
Ah, moça, tu estás no centro da Rosa dos Ventos,
pra onde deres o passo é caminho o que há.
A gente olha pra cima e não vê limite:
é tudo um azulão que não acaba mais.
Mas basta dar meio-dia, o limite aparece,
e não é longe não: bem na boca do estômago.
Sabe, vou te dar um chapéu do tamanho do céu,
que é pra te proteger dos devaneios solares
e pra que todos te percebam e apontem para ti:
“olha lá a moça que sombreia o mundo”.
E todos vão te olhar e todos vão te aplaudir
e o arco-íris vai ficar preto-e-branco de inveja.
Aí, um passarinho, desses bem miudinhos
que trazem uma sanfona de cento e vinte no peito,
vai aparecer e assobiar uma cantiga doce:
e a gente, espiando dentro dos olhos,
começa a sentir um monte de estrelas pipocar.
É isso, quando te encontrei, nasci.
A infância do centauro (2007)