O voo de minha idade
De madura menina
Sobe o degrau
Da casa nº 60
Onde vivem acordados os sonhos
Onde a palavra ressoará alto
Onde vive a doce força deste canto
É singular a estação
Onde meu coração arde:
Nos trilhos da esperança
Nos trilhos da fé
Eu: filha, mãe, avó, tia bisavó
Árvore, raiz, frutos
Amores que brotam do peito
Eu: mulher envolta em palavras,
Sonhos, gritos, esperança,
Coração em brasa
O voo de minha idade transita
Transgressora nas estações
Transita livre na ponte
Do tempo dos meus olhos
Ocupa lugares opostos
Ocupa além-fronteiras no mapa
Nos polos frios do peito
No espelho a imagem da estrada
Percorrida:
Descarregou seus monstros
Bichos e migalhas desertaram
Ficaram para trás
Espelho incauto foi quebrado
A imagem no presente traz votos:
Verdes e amarelos
Coisas que sei do meu mundo de maio
Da lua íntima de minha casa
Da minha única chave que
Abre infinitas portas
Das minhas estranhas festas
Das alegrias íntimas
Do novo ritmo íntimo do coração
Desta casa de nº 60 que ocupo
Cheia de pássaros e árvores nuas
Com telhado de fogo
Portas abertas para novas manhãs
E amoras
A casa de nº 60 é de doidos espelhos
Múltiplos segredos
Coisas doces de minha carne séria
Tem janelas invisíveis
Novos berços compondo paisagens
As redes são transparentes
Para eu lembrar sempre
De mim.
Tudo muda de cor
Na casa de nº 60:
O arco-íris é mais vivo
A vida cintila mais ardente
O sopro é mais límpido
A palavra se vê em luz
No meu coração maduro de menina
Agora importam as coisas
Do dia de hoje quando existo:
sopro desta sombra
meu riso ridículo
olhos de tempestades
meus riscos
doida sabedoria
OLHOS D`ÁGUA – Editora Vento Leste,2015